EXPROPRIAR ATÉ CONSEGUIR TERRENOS SUFICIENTES ... será que a Savannah quer seguir essa via?
- O INCONFIDENTE
- 25 de jun. de 2022
- 3 min de leitura
Ontem, uma leitora especialmente zelosa daquilo que vou escrevendo, enviou-me uma mensagem a propósito do que escrevi ontem sobre os baldios de Dornelas e em especial a parte em que escrevi:
Sem terrenos disponíveis não há exploração de lítio. Apenas com os terrenos de particulares com quem a Savannah celebrou contratos ou comprou os terrenos, não vão conseguir proceder à exploração.
Para esclarecimento desta minha leitora queria esclarecer o seguinte:
Não tem muito tempo de vigência o Decreto Lei 30/2021 de 7 de Maio. Em traços muito gerais, este Decreto lei regulamenta um outro, o Decreto Lei 54/2015 de 22 de Junho que se refere a depósitos minerais. Este Decreto Lei 54/2015 estabeleceu o regime jurídico das actividades de revelação e de aproveitamento dos recursos geológicos existentes em território português.
A páginas tantas, mais concretamente no artigo 32.º que se refere aos “Direitos e obrigações do titular de contrato de concessão de exploração”.
Diz-se nesse artigo:
Artigo 32.º Direitos e obrigações do titular de contrato de concessão de exploração 1 - Decidida a atribuição da concessão de exploração, a DGEG notifica o interessado para fornecer os elementos necessários para a celebração do respetivo contrato do qual constam, como conteúdo mínimo, as especificações constantes do n.º 1 do artigo 29.º 2 - O contrato de concessão assegura ao seu titular os seguintes direitos: (…) e) Requerer a expropriação por utilidade pública dos terrenos necessários à realização dos trabalhos e à implantação dos respetivos anexos, ainda que fora da área demarcada, ficando os mesmos afetos à concessão, ao abrigo do disposto na alínea e) do artigo 28.º da Lei 54/2015, de 22 de junho;
O QUE É QUE ISTO QUER DIZER?
Quem for titular de uma concessão de exploração fica com um conjunto de direitos para além do direito, óbvio, de explorar recursos. Entre esses direitos está o direito que a empresa concessionária tem de requerer a expropriação por utilidade pública de todos os terrenos necessários à realização dos trabalhos de exploração. Sim, todos os terrenos necessários, incluindo os terrenos dos baldios. Numa situação destas, caso se verifique, quase que apetece recomendar um levantamento popular. Mas não é isso que vamos fazer.
Outro direito que a empresa concessionária tem é o de:
f) Obter a constituição, a seu favor, por ato administrativo, das servidões necessárias à exploração dos recursos, ao abrigo do disposto na alínea f) do artigo 28.º da Lei 54/2015, de 22 de junho;
Ou seja, e naquilo que ao projecto de ampliação da mina do Barroso diz respeito, tal como está, a lei permite que se expropriem terrenos e que se constituam servidões, tudo para que o projecto de exploração possa prosseguir. A Savannah, ao abrigo da lei portuguesa, pode seguir esta via.
Deste modo e para clarificar, em teoria, se a Savannah não tiver os terrenos necessários que lhe permitam proceder à exploração do litio, pode iniciar processos de expropriação e um processo para criação de servidões.
Mas entre a teoria e a prática vai alguma distância.
Nesta altura do campeonato, ou seja, com um contrato de concessão de 2006, ao qual foi feita uma adenda em 2016, com um estudo de impacto ambiental apresentado e que neste momento está em apreciação pela agência portuguesa do ambiente, não nos parece racional que a Savannah inicie processos de expropriação dos terrenos necessários à concretização do projecto. É que, como o próprio nome indica, trata-se de um processo que envolve várias entidades, nomeadamente, o Governo que terá de emitir uma declaração de utilidade pública. Essa declaração pode ser atacada judicialmente. A própria expropriação pode assumir um carácter litigioso, o que fará com que o processo se torne mais moroso.
Tempo - parece-me - que é coisa que a Savannah não tem.
Para concluir recordo o recente caso judicial decidido pelo Tribunal Superior de Justiça da Estremadura que obrigou a Iberdrola a devolver ao proprietário cerca de 525 hectares de terrenos onde foi instalada a central fotovoltaica Núñez de Balboa. Na base desta decisão está, precisamente, um processo de expropriação que o tribunal espanhol considerou ilegal. Parece que no decurso do processo de licenciamento uma série de entidades públicas espanholas certificaram que os terrenos onde seria construída a Central eram terrenos públicos. Parece que não. E o Sr. Santos Lázaro Arias, proprietário dos terrenos, recorreu ao tribunal e, por agora, ganhou a causa. A Iberdrola já anunciou que vai recorrer da decisão.
Isto para dizer que um processo de expropriação pode ser doloroso, para ambas as partes, a parte que expropria e a parte que é expropriada e não me parece que a Savannah queira ir por aí. Em qualquer caso fica o aviso. É uma possibilidade legal e não me admiraria de no futuro ver terrenos expropriados para dar lugar a projectos que sejam entendidos por parte das autoridades, como de interesse público.
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